Aqui está uma reescrita do diálogo entre Paul Krugman e Peter Coy sobre as perspectivas econômicas em curto prazo nos Estados Unidos:
Paul Krugman: Vamos mudar um pouco as coisas. Em vez de seguir o formato habitual, hoje iremos conduzir uma conversa sobre as perspectivas econômicas de curto prazo nos Estados Unidos. Nos últimos meses, Peter e eu meio que tivemos um diálogo implícito, já que nossos textos frequentemente apresentam visões opostas da situação econômica. No entanto, na semana passada, decidimos conversar diretamente e achamos que seria interessante compartilhar nossas trocas com os outros.
Então, a pergunta é a seguinte: Estamos nos aproximando de um pouso suave, de uma recessão ou algo diferente nos Estados Unidos?
Peter Coy: Antes de responder à sua pergunta, quero deixar claro que há uma grande diferença entre fazer uma previsão e desejar um determinado resultado. Eu definitivamente não desejo uma recessão. No entanto, acredito que é provável que enfrentemos uma recessão, seja este ano ou no próximo. Minhas colunas no New York Times têm expressado visões pessimistas, incluindo um artigo em julho intitulado “Desculpe, mas ainda acredito que uma recessão está a caminho”.
Devo ressaltar que não sou economista nem apareço na TV como um deles. Paul, você é um laureado com o Prêmio Nobel, enquanto eu nunca pisei em Estocolmo. No entanto, como mencionei em meu artigo de julho, não estou pedindo que você simplesmente aceite minha palavra. Estou cumprindo meu papel como jornalista, apontando fatos. Um fato importante é que o Federal Reserve nunca elevou as taxas de juros tão rapidamente sem provocar uma recessão.
A extremidade inferior da faixa da taxa básica de juros de referência subiu de zero em março do ano passado para 5,25%. Ainda não experimentamos totalmente os efeitos desse aumento significativo. Como os economistas costumam dizer, a política monetária tem “intervalos longos e variáveis”. O período médio entre o início de um ciclo de aperto do Fed e o início de uma recessão é de cerca de 22 meses. Isso nos levaria a esperar uma recessão por volta de janeiro, embora, como mencionei, os intervalos variem.
Paul Krugman: Concordo que há uma distinção significativa entre prever uma recessão e desejar uma. Também existe uma diferença relacionada entre acreditar que precisamos de uma recessão, mesmo que não a desejemos, e acreditar que realmente teremos uma.
No início deste ano, muitos economistas, incluindo o famoso Larry Summers, acreditavam que precisávamos de uma recessão para controlar a inflação, assim como fizemos depois da inflação dos anos 1970.
Até dezembro passado, as projeções econômicas do Fed indicavam que a inflação diminuiria, mas apenas à custa de um aumento sustentado do desemprego, ultrapassando os 4,5%.
No entanto, nesse ponto, a argumentação de que precisamos de uma recessão para conter a inflação parece cada vez mais insustentável. Como mencionei na semana passada, a inflação está diminuindo rapidamente sem um aumento significativo no desemprego; parece que a inflação era transitória afinal.
A questão agora é se teremos uma recessão de qualquer maneira, ou seja, se o aperto do Fed resultará em uma recessão desnecessária. Nesse aspecto, as perspectivas estão bastante incertas.
A famosa frase de Milton Friedman sobre “intervalos longos e variáveis” tem sido questionada recentemente, com algumas sugestões de que esses intervalos podem ter encurtado consideravelmente. Se eles forem realmente longos, poderemos entrar em uma recessão; se não forem, não entraremos.
Para ser honesto, não tenho certeza do que acreditar nesse momento. Toda essa sequência de eventos causada pela pandemia tem sido incomum, para usar um termo técnico. As analogias históricas não parecem ser tão úteis como costumam ser. A economia tem sido surpreendentemente resiliente diante dos aumentos das taxas de juros, mas não consigo prever se isso continuará.
Colocando de outra forma: se nossa suposição histórica é que o aperto do Fed levará a uma recessão, esperaríamos que isso afetasse principalmente o mercado imobiliário, como de costume. No entanto, os aumentos do Fed resultaram em uma grande elevação das taxas de juros hipotecários, que atingiram 7% quase um ano atrás e têm flutuado desde então.
Surpreendentemente, o número de novas casas construídas, após uma queda inicial, se manteve bastante robusto, no mesmo nível ou até acima dos níveis pré-pandêmicos. Portanto, o mecanismo usual pelo qual os aumentos das taxas de juros levam a uma recessão não parece estar funcionando como esperado. Existem outras maneiras de uma recessão ocorrer, mas, como mencionei, as correlações históricas podem não ser um guia confiável.
Coy: Paul, você trouxe à tona pontos importantes sobre as incertezas em torno de uma possível recessão. O fato de o Fed não estar mais tão preocupado com uma recessão me deixa apreensivo, porque isso pode aumentar a probabilidade de o Fed elevar as taxas de juros quando não deveria ou de não reduzi-las quando deveria, tornando a recessão ainda mais provável.
Com base nas declarações de política e nas projeções econômicas divulgadas na semana passada, o Comitê Federal de Mercado Aberto (FOMC) parece acreditar que há poucas chances de uma recessão. A previsão média de crescimento para este ano subiu para 2,10%, em comparação com a previsão de 1% em junho. A previsão para o próximo ano também aumentou, chegando a 1,50%, em comparação com 1,10% em junho. Parece que estamos navegando tranquilamente!
Se o FOMC possuísse um histórico notável de previsões precisas, seu otimismo poderia ser encorajador. No entanto, o FOMC tem demonstrado repetidas falhas em detectar pontos de virada na economia, seja em direção ao crescimento ou declínio. Há uma preocupação de que esse padrão esteja se repetindo.
Krugman também manifestou apreensão em relação ao otimismo do Fed, lembrando os momentos em que Ben Bernanke declarou que a crise dos subprimes estava “contida”. Embora o Fed, assim como outros analistas econômicos, tenha dificuldades em identificar com precisão esses pontos de virada, não parece ser um indicador confiável de previsão de recessão só porque o Fed não a antecipa.
O que realmente surpreendeu nas últimas projeções do Fed foi o crescente otimismo quanto a uma possível desaceleração suave. Se voltarmos às projeções de dezembro do ano passado, as expectativas do Fed para a inflação futura permaneceram relativamente estáveis. No entanto, naquela época, previa-se uma desaceleração da inflação devido a um aumento significativo no desemprego, o que agora não é mais previsto nas projeções.
Outro ponto a ser destacado são os números recentes referentes aos novos pedidos de seguro-desemprego, que às vezes funcionam como um indicador precoce de crises econômicas. Segundo especialistas, esses números estão “excepcionais” e atingiram o ponto mais baixo desde janeiro. Portanto, até o momento, não há indícios de que uma recessão esteja ocorrendo.
Coy acrescenta que ainda existe a possibilidade de uma recessão na chamada “zona cinzenta”, na qual a taxa de desemprego não aumenta significativamente. Na verdade, ele já escreveu sobre essa possibilidade no mês passado. Isso representaria um resultado positivo, onde a produção econômica diminui, mas as empresas não demitem muitos funcionários, possivelmente porque reconhecem a dificuldade de recrutar pessoal quando a recessão chegar ao fim. Enquanto muitos se preocupam com a automação substituindo empregos, o problema atual reside na escassez crônica e persistente de trabalhadores, em vez de um excesso deles. No entanto, ele sugere que esse é um tópico para ser discutido em outro momento.
Fonte: The New York Times