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Ruim para a indústria, bom para o consumidor? Brasil vislumbra enxurrada de produtos chineses

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Setores nacionais de roupas, calçados e eletrônicos podem sentir impactos de enxurrada de produtos chineses no país. (Foto: Ilustração/Gazeta do Povo com DALL-E)

A guerra comercial que está sendo travada entre Estados Unidos e China pode ter impactos relevantes sobre a economia brasileira. Com a aplicação de tarifas de até 145% sobre produtos chineses exportados para os EUA, Pequim deve buscar novos mercados — e o Brasil pode acabar na linha de frente como destino alternativo para os bens manufaturados do gigante asiático.

Especialistas em comércio internacional ouvidos pela Gazeta do Povo avaliam que o Brasil pode se tornar um destino alternativo para esses produtos. Segundo José Augusto de Castro, presidente executivo da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), o país pode ser inundado por produtos chineses.

Isso se deve, em parte, à própria estrutura comercial brasileira, que é mais voltada à importação de bens manufaturados e à exportação de commodities, liderada pelo agronegócio e pela indústria extrativa de minérios, por exemplo.

Arno Gleisner, diretor de Comércio Exterior da Câmara de Comércio, Indústria e Serviços do Brasil (Cisbra), destaca que o agronegócio tende a sofrer menos com essa reconfiguração comercial por ser mais competitivo do que sua contraparte chinesa.

Por outro lado, setores como o têxtil, calçadista, de eletrônicos e de equipamentos ópticos estão entre os mais vulneráveis. Também correm risco fabricantes de brinquedos, móveis e autopeças, segundo o diretor estratégico da consultoria em comércio exterior Becomex, Renato Promenzio.

O comércio EUA-China em números
Atualmente, o comércio bilateral entre Estados Unidos e China é da ordem de US$ 582,4 bilhões, segundo dados do governo americano relativos a 2024. Desse total, US$ 143,5 bilhões correspondem às exportações dos EUA para a China e US$ 438,9 bilhões, às importações originárias do país asiático.

A Organização Mundial do Comércio (OMC) estima que, caso a escalada tarifária prossiga (veja uma breve linha do tempo ao fim desta reportagem), o comércio entre os dois países pode diminuir em até 80%. Nesse cenário, o PIB global poderia sofrer uma queda de 7%.

Dos Estados Unidos, a China compra petróleo e grãos, principalmente soja — o que pode reforçar as oportunidades para o agro brasileiro junto ao país asiático —, enquanto os americanos importam produtos com maior valor agregado dos chineses, como equipamentos elétricos, eletrônicos e máquinas.

Em tese, os chineses teriam mais facilidade para encontrar fornecedores alternativos para o que compram dos Estados Unidos, mas enfrentariam dificuldades para encontrar mercados capazes de absorver o que vendem aos americanos.

Brasil e China defendem multilateralismo
Na última semana, o vice-presidente e ministro da Indústria, Comércio Exterior e Serviços, Geraldo Alckmin, participou de uma videoconferência com o ministro do Comércio da China, Wang Wentao. Ambos reforçaram a defesa do multilateralismo e do fortalecimento da OMC.

Segundo nota distribuída à imprensa, ambos convergiram na importância da defesa do “multilateralismo e do sistema internacional de comércio baseado em regras, com o fortalecimento da Organização Mundial do Comércio”.

O alinhamento político demonstrado na declaração pode indicar que, mesmo com o aumento do fluxo de importações da China, o Brasil tenderá a evitar medidas protecionistas como elevação de tarifas ou criação de novas taxas.

Castro, da AEB, avalia que seria realmente difícil taxar a entrada de uma gama de produtos chineses sem incorrer em uma política semelhante à de Trump, que tem sido abertamente criticada pelo governo brasileiro e rebatida pelos chineses.

Entrada de produtos chineses: preços ao consumidor podem não ter alívio
A entrada de produtos chineses com preços mais baixos levanta a expectativa de uma possível redução no custo de bens de consumo. No entanto, José Augusto de Castro pondera que as importações da China já fazem parte do “dia a dia” do brasileiro e apenas aumentariam em volume, sem trazer novos produtos ou inovações capazes de reduzir o preço final.

“Então, por isso, em princípio, eu acho que não haveria redução de preço para o consumidor, porque não creio que as empresas vão importar o produto agora e automaticamente reduzir aquele preço”, argumenta.

Por outro lado, Arno Gleisner e Renato Promenzio avaliam que existe uma chance real de que o consumidor sinta um certo alívio nos preços de produtos do dia a dia fabricados na China ou que utilizem insumos e componentes de lá. Eles destacam que a redução pode ocorrer em eletrônicos, roupas, calçados e utilidades domésticas — incluindo até brinquedos.

Cotas e processos antidumping contra produtos chineses
Na visão de Renato Promenzio, da Becomex, a entrada de produtos chineses mais baratos pode pressionar fortemente a indústria nacional, principalmente setores que já operam com margens apertadas.

Nesse cenário, Arno Gleisner avalia que a simples aplicação de tarifas de importação mais altas complicaria a relação com a China, grande importadora de produtos brasileiros. “Talvez a utilização de cotas de importação fosse aceitável para ambas as partes”, sugere.

Outra estratégia que a indústria nacional poderia adotar para evitar maiores perdas seria mover, caso a caso, medidas antidumping — um instrumento de defesa comercial que visa proteger a indústria doméstica frente a importações de bens a preços inferiores aos praticados no mercado interno.

Escalada tarifária EUA x China: linha do tempo
Entenda, de forma resumida, os principais pontos da escalada atual da guerra comercial entre os EUA e a China:

1.º de fevereiro – o presidente americano impôs taxas de 10% sobre todas as importações vindas da China;
4 de fevereiro – entram em vigor as tarifas de 10% sobre produtos chineses. China retalia os EUA com tarifas de 15% sobre carvão e gás natural, e de 10% sobre petróleo bruto e máquinas agrícolas, carros com motores de alta cilindrada e caminhonetes;
10 de fevereiro – entram em vigor as medidas chinesas. Estados Unidos anunciam retirada de isenções de tarifas sobre o aço, que chegam a 25%, e eleva tarifas de importação de alumínio de 10% para 25%;
4 de março – EUA elevam para 20% tarifas sobre bens e produtos chineses. China impõe tarifa de 15% sobre importações de produtos agrícolas dos EUA;
10 de março – entram em vigor as tarifas chinesas de 15% contra produtos agrícolas dos EUA, incluindo frango, carne suína, soja e carne bovina;
12 de março – as tarifas globais dos EUA sobre aço e alumínio, que incluem o Brasil e a China, entram em vigor;
24 de março – Trump afirma que imporá tarifas de 25% sobre quaisquer países que compram petróleo da Venezuela – 68% do petróleo exportado pelo país sul-americano é comprado pela China, de acordo com Administração de Informações sobre Energia dos EUA. A tarifa se somaria aos 20% já aplicados contra a China;
2 de abril – anúncio das tarifas recíprocas dos EUA, elevando as tarifas para China a 34%;
4 de abril – China retalia anunciando plano para elevar tarifas contra os EUA para 34%, além de elevar controle de exportações de terras raras e de colocar 27 empresas americanas em lista de sujeição à sanções comerciais e controles de importação;
5 de abril – entrada em vigor de parte das tarifas anunciadas no dia 2 de abril, com 10% para todos os produtos importados, elevando as tarifas da China para 30% (20% em 4 de março + 10%);
7 de abril – Trump diz que elevará as tarifas contra a China para 84% (34% da tarifa recríproca +50% em resposta à retaliação chinesa);
8 de abril – China aciona Organização Mundial do Comércio contra tarifas praticadas pelos EUA;
9 de abril – entram em vigor tarifas recíprocas dos EUA, mas o governo recua, mantendo a tarifação global em 10%, exceto para a China, que tem suas tarifas elevadas para 84%. Somados aos 30% anteriores, as tarifas contra o país asiático chegam a 104%. China retalia com 84% de tarifas contra os EUA e Trump eleva tarifas para 125%;
10 de abril – EUA esclarecem que, na verdade, as tarifas contra a China são de 145%, pois aos 125% se somam tarifas de 20% que seriam relacionadas a exportações de produtos para a fabricação de fentanil (pontente opióide), com efeito imediato;
11 de abril – China eleva tarifa contra os EUA para 125%. A administração dos EUA anuncia que produtos eletrônicos, como semicondutores, computadores e smartphones ficariam de fora das tarifas recíprocas, até mesmo da universal de 10%;
12 de abril – entram em vigor as tarifas de 125% da China contra os EUA.
“Disse me disse” entre China e EUA
Desde a semana passada, o presidente Trump e autoridades chinesas têm protagonizado mais um episódio da guerra tarifária entre ambos os países, mas, dessa vez, o embate é verbal.

O “disse me disse” teve início na terça-feira (22), quando Trump afirmou a repórteres no Salão Oval que iria reduzir as tarifas contra a China. No dia seguinte, ele ainda alegou que havia conversas entre os EUA e o país asiático para negociar as tarifas.

As falas de Trump foram prontamente ironizadas pelos chineses. Na quinta-feira (24), o porta-voz do Ministério do Comércio chinês, He Yadong, disse que, “como diz o ditado: ‘quem amarrou o sino deve desamarrá-lo’”.

No mesmo dia, o porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da China, Guo Jiakun, afirmou que “China e Estados Unidos não se envolveram em nenhuma consulta ou negociação sobre a questão tarifária, muito menos chegaram a algum acordo”, afirmando que se tratava de “notícias falsas”.

Na sexta-feira (25), em entrevista à revista Time, Trump voltou a falar sobre as negociações com a China, afirmando, inclusive, que o ditador chinês, Xi Jinping, teria ligado para ele para tratarem sobre o tema.

Nesta segunda (28), a China voltou a rebater as declarações de Trump. Guo Jiakun declarou que “não houve telefonema recente entre os dois chefes de Estado” e reforçou que “China e Estados Unidos não estão envolvidos em consultas ou negociações sobre tarifas”.

Leia mais em: https://www.gazetadopovo.com.br/economia/ruim-para-a-industria-bom-para-o-consumidor-brasil-vislumbra-enxurrada-de-produtos-chineses/
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