As inundações no Rio Grande do Sul já somam à agropecuária do Estado um prejuízo aproximado de R$ 3 bilhões para áreas totalmente inundadas, segundo um cálculo preliminar feito pela Federação da Agricultura do Estado do Rio Grande do Sul (FARSUL) a partir de um mapeamento com 550 produtores gaúchos de porte médio.
Esse valor é resultado de uma previsão a partir das respostas de 347 produtores gaúchos que concordaram em revelar os valores financeiros para as perdas. Dentro desse grupo entrevistado, o prejuízo total é estimado em R$ 467 milhões.
A FARSUL também observa que a média de prejuízo por produtor entrevistado fique em cerca de R$ 1.4 milhão com o excesso de chuvas, incluindo gastos com investimento, arrendamento, comercialização e dívidas. Além desse valor, mais R$ 415.000,00 seriam só de perdas com custeio de safra.
Os dados foram cruzados com um levantamento anterior da Serasa Experian, que mapeou o perímetro de terrenos afetados gravemente pelas chuvas que começaram no dia 2 de maio. Com isso, o resultado preliminar de prejuízos para as áreas inundadas é dos R$ 3 bilhões, cujo montante a entidade considera estar muito longe do prejuízo “real”.
Outras formas de prejuízo ainda não quantificadas estão inseridas no processo de comercialização dos produtos colhidos e que estão para colher, em especial os grãos. Segundo Luz, produtores já apontam grãos de soja ardidos, brotados, podres, germinados ou que estão acima da umidade. Isso representa um problema no desenvolvimento vegetativo e, consequentemente, nas vendas, pois cooperativas e outros mercados não estão aceitando o produto gaúcho.
Auxílios aos produtores
Para o Presidente da FARSUL, a situação é pior que a vivida nas últimas safras e durante a pandemia, mas é a “pá de cal em cima do produtor gaúcho”. Para ele, o temor de recuperação da agropecuária regional só vai parar de rondar se o governo federal liberar R$ 500 milhões a serem destinados a subsídio do prêmio ao seguro rural, valor que será um ‘piso’ para viabilizar a safra 2024/25, além de um fundo de aval.
Esses são os principais pleitos que a entidade vai destacar ao ministro da Agricultura e Pecuária, Carlos Fávaro, que estará no município de Santa Cruz nesta terça-feira (28/05).
“Há muita expectativa com a visita do ministro e que ele não venha entregar só máquinas para prefeituras, ainda que isso seja importante. Afinal, tudo que o governo federal fez até agora foi entregar prorrogação dos pagamentos dos custeios das dívidas até 14 de agosto e dos financiamentos de máquinas agrícolas”, disse Pereira, dizendo que são medidas insuficientes para a situação de emergência do Estado.
O levantamento também questionou o nível de endividamento dos produtores entrevistados. Entre os 536 que responderam, quase 60% disse que está 100% endividado, enquanto os restantes disseram ter dívidas de safras passadas, renegociadas, com vencimento para este ano. Segundo o levantamento, apenas em custeio, o total do endividamento é de R$ 249.1 milhões entre os entrevistados. Por produtor, essa média é de R$ 415.200,00.
Em relação ao nível de impacto em suas áreas, 63,50% dos produtores que participaram do levantamento responderam que foram muito impactados, enquanto 34% foram parcialmente afetados. Os danos imediatos, segundo a FARSUL, poderão ser atenuados com liberação de crédito e subvenção governamental, ainda que a recuperação do Estado demore.
Pessimismo
A organização observou que o sentimento é de pessimismo entre 60,40% dos entrevistados. O percentual acende um alerta para a continuidade na atividade agropecuária ou mesmo a redução dos tamanhos dos negócios dos produtores. Demissões ou rescisões de férias coletivas estão para acontecer, como antecipam os respondentes. Entre eles, 40,40% já indicam que pretendem suspender contratos ou implementar férias coletivas.
“Isso é ainda uma pequena realidade dentro do grupo de produtores e mostra que estamos sem amparo, de não saber o que fazer, se vale a pena continuar ou colher, pois o que estamos colhendo, estamos jogando fora. Esse produtores são médios, não têm silo próprio, não tem o que fazer”, disse Graziele de Camargo, produtora de soja e coordenadora do Movimento SOS Agro RS.
Graziele lembra que majoritária parte das lavouras afetadas não possui seguro, em especial porque o Estado vem de seguidas quebras, o que fez seguradoras recuarem na oferta de planos que compensem o pagamento do produtor.
Diante disso, o pedido da FARSUL é de uma linha de crédito com 15 anos para pagamento das dívidas, dois anos de carência e taxa de juros de 3% ao ano. “Nossa proposta é conseguir financiamento através do sistema financeiro, com abertura de uma linha nova, onde há um fundo de aval garantidor do governo para dar o subsídio. O produtor poderá acessar essa linha, quitar os compromissos e ficar com uma única dívida de longo prazo”, detalhou o economista-chefe da entidade, Antônio da Luz.
A proposta está em um documento que a FARSUL apresentou a agricultores do Estado, coletou 180 assinaturas e aguarda a aprovação do governo federal.
Área afetada
Os 550 produtores que participaram do levantamento da FARSUL respondem por uma área aproximada de 33.600 hectares cultiváveis, que tiveram algum tipo de dano. A sojicultura foi a mais afetada no Estado, equivalendo a 46% (15.400 hectares) de terrenos atingidos. Em seguida, estão os 4.500 hectares de arroz afetados, ou cerca de 13% da área total prejudicada.
Segundo o mapa da entidade, na pecuária, 23.600 animais foram atingidos. Desses, 22.100 correspondem ao rebanho de bovinos, quase 94% do rol do segmento.
Arroz
A medida do governo federal de estimular a importação de arroz continua incomodando a FARSUL, que fez duras críticas à decisão nesta segunda-feira (27/5). Segundo o Presidente da entidade, Gedeão Pereira, a iniciativa é desnecessária e irá impactar não essa, mas a próxima safra do Estado a ser plantada, de 2024/25. Ele explica que isso desestimula o produtor gaúcho, porque a medida desequilibrará a oferta no futuro.
Segundo o Presidente da FARSUL, a decisão de importar arroz complica o futuro dos arrozeiros gaúchos, que poderão sofrer com a competição dos preços dos estoques públicos e até desistirem da atividade.
Para Antônio da Luz, outro fator preocupante para os produtores gaúchos é decidir se manter nos arrozais, pois com a decisão de importar o produto, os preços podem cair e não compensarem o custo de produção que os arrozeiros têm.
“O governo comprar 1 milhão de toneladas de arroz, cuja qualidade é bem inferior à produzida no Brasil, com questões ambientais gravíssimas e com usos de produtos que são proibidos em nosso país há décadas, é levar todo o restante da produção brasileira a um recuo de preço. As pessoas vão ter prejuízo”, detalhou Luz.
O economista falou, ainda, que esse tipo de ação pode levar a uma possível redução de área de plantio, como aconteceu com o trigo na Argentina, porque os agricultores perdem interesse econômico na atividade.
Nas últimas semanas, o governo federal anunciou tarifa zero de importação de arroz a fim de aumentar as compras externas, além de lançar um programa para estimular importações por meio de leilões de compras do produto importado pela Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). Os recursos para tanto somam mais de R$ 7 bilhões, o que despertou o descontentamento da FARSUL, que assegura que o Estado gaúcho vai conseguir atender a demanda interna do Brasil.
Globo Rural